Por: Profº Raul Cuore
Resumo
Ética e ciência, esta discussão necessita previamente passar pela concepção filosófica de “ser humano”, ‘ética’ e ‘ciência’. Na perspectiva existencialista, o homem é um ser capaz de autodeterminação, ou seja, ser sujeito do conhecimento e da ação. Em conseqüência, no campo ético, tudo aquilo que tira ou diminui essa dimensão de sujeito é considerado violência. Por sua vez, a ciência moderna ocidental contém em si um amplo projeto de dominação: da natureza, de si mesmo e do outro. Portanto, uma ciência ética só é possível a partir de uma nova postura diante da própria ciência e dos valores da sociedade.
1. Introdução
A relação ética e ciência é um dos debates que nos foram equacionados no século XXI. A partir do lançamento da bomba nuclear nas cidades de Hiroshima e Nagasaki no Japão no fim da II Guerra Mundial em 1945, e mais neste século com a degradação do meio ambiente, a ambigüidade do progresso científico e tecnológico passou do plano teórico para o existencial. Começamos a perceber na vida cotidiana a deterioração do ambiente físico e social ao lado do mundo maravilhoso da tecnologia. Isto cria um paradoxo entre a ciência e a ética.
As conquistas tecnológicas nos campos da comunicação, transporte, alimentação, moradia, saúde e lazer convivem ao lado do desequilíbrio ecológico, da miséria, da fome, o desemprego, os sem-terra, sem-teto, enfim ao lado de toda a violência que destrói dignidade humana.
Para falarmos da relação entre ciência e ética é preciso, ao principio buscarmos uma definição para a ética, e como esta vem a se contrapor a ciência.
2. Como definirmos ética?
Poderíamos entender ética de várias formas. Uma delas poderia ser como a busca ou caminho para ou pela “verdade” que seria, talvez, e em algumas condições, subjetiva.
Se relembrarmos da origem da filosofia na Grécia, por exemplo, os sofistas, que através da retórica e do convencimento pelas palavras, da oratória, julgavam que “a verdade é resultado da persuasão e do consenso entre os homens”. Isso era combatido por Sócrates, Platão e Aristóteles que julgavam ser a essência da verdade através da razão e não do “simples” convencimento e consenso. Sócrates fazia isto através de perguntas básicas, feitas a diversos profissionais especialistas, tais como: ao “sapateiro” – o que é um sapato? Ao “juiz” - o que é a justiça? Ou o que é a verdade? E assim, a partir de um questionamento, buscava desvendar, através da razão e da lógica e não mais por um simples convencimento retórico, o que seria esta verdade.
Poderíamos dizer então que, de certa forma, Sócrates inaugura a ética dentro do discurso. Sócrates, como comenta MARCONDES (1998) seria:
“(...) um divisor de águas. É nesse momento que a problemática ético-política passa ao primeiro plano da discussão filosófica como questão urgente da sociedade grega superando a questão da natureza como temática central, pois a temática racionalista filosófica, inicialmente, era a natureza, iniciada por Tales de Mileto que buscava na própria natureza a explicação para ela própria, se afastando assim do mito em que tudo era explicado pelos deuses...”
Assim teríamos a questão da subjetividade na ética, e a formação da própria sociedade interagindo entre ela e os indivíduos. A ética ajudando-nos a refletir sobre os costumes, sobre as práticas da ciência, da religião, da família, da empresa, em fim, em todas as instituições da sociedade. A ética nos ajuda a pensar a subjetividade. Que sujeito é esse em tal momento da história? Que sujeito é este hoje? Que “conhecimento” é este que buscamos pela ciência?
Ainda MARCONDES (1998) nos define ética da seguinte forma: “A ética do grego “ethike”, diz respeito aos costumes e tem por objetivo elaborar uma reflexão sobre os problemas fundamentais da moral (finalidade e sentido da vida humana, os fundamentos da obrigação e do dever, natureza do bem e do mal, o valor da consciência moral.”
3. A ciência, a ética e a filosofia
o existe um profissional ético, sem antes um homem ético. Portanto, a discussão sobre ética deve ser vista como uma situação-problema que provoca e estimula uma reflexão abrangente sobre a própria natureza da relação ética e ciência.
Em sua reflexão sobre o conceito de progresso MATOS (1993) conclui que: “como não há progresso que não seja também moral, a principal tarefa dos nossos dias é o combate pelo progresso dos direitos humanos.”
Referenciando a utopia que temos em comum: a humanidade com vida digna e feliz. Visto deste ponto, a reflexão filosófica não tem a utilidade imediata no sentido do senso comum. Sua contribuição à ciência e à técnica explicando os fundamentos epistemológicos e metodológicos e certamente, éticos. Citando CHAUÍ (1994): “Não se trata, pois, rigorosamente de uma ciência, mas de uma reflexão em busca de uma fundamentação teórica e crítica dos nossos conhecimentos e de nossas práticas”.
Segundo o existencialismo, o ser humano está em processo de autoconstrução. Em outras palavras, é um agente transformador da Natureza que, ao transformá-la, constrói sua própria essência. A natureza humana vem sendo construída pela própria humanidade no processo histórico atualizando sua potencialidade com agente transformador. Sobre este conceito MATOS (1993) nos expõe:
“Temos uma natureza em devir. O ser humano é, ao mesmo tempo, um ser atualmente advindo e um ser ainda a vir, apenas prometido a si mesmo. (...) É aqui que se manifesta a estrutura fundamental da ação: de um lado, ela é aquilo em que se tornou, aquilo que ela é agora: do outro, também é uma antecipação de seu ser realizado e, por ser ação de um agente autônomo, ela implica em si a responsabilidade daquilo que fazemos de nós mesmos. E veremos como a responsabilidade de cada ser humano para consigo mesmo constitui, ao mesmo tempo, um responsabilidade que ele tem com todos os homens”.
4. ciência e ética nos dias atuais
A ciência, traço que singulariza as sociedades modernas, vem sendo analisada sob os mais diversos ângulos. Desde o enfoque mais clássico da epistemologia ao olhar mais recente dos estudos culturais, multiplicam-se os estudos sobre a atividade científica. Entretanto, em nossos dias, uma perspectiva, a da ética, exerce particular interesse, associada ao desenvolvimento contemporâneo das ciências da vida.
Alternativas inéditas, antigamente nem sequer questionadas, fazem hoje, parte do cotidiano. Possibilidades como a preservação duradoura da vida em condições artificiais, a intervenção em fetos ou as que decorrem do amplo repertório de ações ligadas à clonagem evidenciam a expansão do nosso poderio científico-tecnológico. Poderio que nos inscreve, de imediato, no horizonte ético: podendo fazer, devemos fazer?
Os órgãos que regulam a ética nas pesquisas científicas que envolvam seres humanos, o crescente cuidado no trato dos animais associados à pesquisa científica, a atenção e a sensibilidade com que são vistas as questões relativas à intervenção no meio ambiente são indicadores de que estamos diante de um novo cenário. Mas, se, de um lado, devemos celebrar o reaparecimento da temática ética, na medida em que se localiza no campo da ação humana, por outro lado, cabe perguntar sob que condições é razoável esperar uma aproximação permanente entre a ciência e a ética.
Ética, entre outras coisas, significa restrição. O recurso a valores, constitutivos de qualquer agenda ética, implica aceitar proibições e limites. Caso existisse, uma sociedade inteiramente permissiva levaria à supressão da dimensão ética, que se tornaria supérflua num ambiente onde tudo fosse tolerado.
Se aceitarmos a associação entre a atitude ética e o estabelecimento de alguma espécie de limite, como poderíamos aproximar a ética e a ciência, entre os procedimentos éticos e a busca do conhecimento?
No contexto da sociedade atual, à que pertencemos, a criação dos campos científicos na modernidade ocidental é decorrência, entre outros fatores, da ideologia que preconiza a defesa da liberdade mais plena no que diz respeito ao conhecimento. A concepção moderna de ciência, a que estamos, ainda hoje, associados, é inseparável da progressiva reafirmação do princípio da autonomia da pesquisa e da rejeição, inegociável, da tutela, seja religiosa, seja política.
5. Conclusão
Notamos que nos dias de hoje várias instituições se preocupam em elaborar um código de ética. Isso demonstra claramente a necessidade que a sociedade tem de “controlar” as medidas e atitudes das diversas profissões. Será que podemos permitir que a ciência, por exemplo, faça o que ela quiser? A ciência pode pesquisar o que ela quiser?
A ética seria desta maneira então, intermediária, buscaria a justiça, a harmonia e os caminhos para alcançá-las. Quando buscamos, a justiça, a verdade, o entendimento e o conhecimento, o buscamos para satisfazer uma necessidade do sujeito.
O que é que distingue a ciência da não-ciência? Como podemos demarcar a fronteira entre elas? É importante mencionar que a ciência deve ser entendida de maneira diversa, conforme o tempo em que a estudamos. O que chamamos de “conhecimento científico”, também, pode variar conforme os diversos períodos da história. Na área médica, por exemplo, quando ouvimos uma voz científica dizendo: evite comer ou fazer tal coisa, que faz mal à saúde, e depois alguns anos mais tarde se contradizem dizendo que não é bem assim. Podemos citar o recente comunicado da Agencia Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa) com respeito à gema do ovo mal cozida.
Concluiu-se que ciência é um conhecimento sistemático, dá-se pela leitura, reflexão, sistematização, conhecimento lógico, sendo quase impossível vivermos sem seus benefícios. A ciência tenta discernir com sabedoria ética o melhor para o ser humano. Sendo de muita importância este apelo ético na ciência, pois a sociedade depende das conseqüências.
A ética é uma característica própria a toda ação humana, tendo como objetivo facilitar a realização das pessoas. A ciência envolve investigação e busca pela verdade. Na ciência temos a ética como suporte para não haver erros, pois a responsabilidade faz parte da ética e é fundamental no meio cientifico. A produção cientifica não se realiza fora de um determinado contexto social e político.
6. Referências
CHAUÍ, M. Convite à filosofia. São Paulo: Ática, 1994.
MATOS, O. C. F. A escola de Frankfurt: luzes e sombras do iluminismo. Coleção Logos. São Paulo: Editora Moderna, 1993.
MARCONDES, Danilo. Iniciação à História da Filosofia. São Paulo: JZE. 2º ed.1998.
Perfil do Autor
Professor de Matemática e Fisica na Rede Particular de Campo Grande - MS. Graduado em Matemática, Pós-Graduando em Eduacação Matemática.
Fonte do Artigo - http://www.artigonal.com/educacao-artigos/etica-e-ciencia-urgencia-do-debate-982236.html
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